quinta-feira, 2 de julho de 2015

Ler ... Jorge Amado




"Pastoreávamos a noite como se ela fosse um rebanho de moças, e a conduzíamos aos portos da aurora com nossos cajados de aguardente, nossos toscos bordões de gargalhadas.
E, se não fôssemos nós, pontais ao crepúsculo, vagarosos caminhantes dos prados do luar, como iria a noite - suas estrelas acendidas, suas ...esgarçadas nuvens, seu manto de negrume -, como iria ela, perdida e solitária, acertar os caminhos tortuosos dessa cidade de becos e ladeiras? Em cada ladeira um ebó, em cada esquina um mistério, em cada coração nocturno um grito de súplica, uma pena de amor, gosto de fome nas bocas de silêncio, e Exu solto na perigosa hora das encruzilhadas. Em nosso apascentar sem limites, íamos recolhendo a sede e a fome, as súplicas e os soluços, o estrume das dores e os brotos da esperança, os ais de amor e as desgarradas palavras doloridas, e preparávamos um ramalhete cor de sangue para com ele enfeitar o manto da noite."


Jorge Amado, em "Os Pastores da Noite" 

Sem comentários:

Enviar um comentário