domingo, 5 de julho de 2015

SOLIDÃO E EXÍLIO

«A leitura é uma atividade solitária. É o lugar da solidão. É natural ver que os índices de leitura só caem. Há inúmeros fatores. Culturais, sociais, econômicos etc. Existe um outro fator que ninguém dá muita atenção. A leitura te permite ficar totalmente sozinho. É um hábito que tende a desaparecer. Não a leitura, mas a solidão. Ninguém suporta, ao que tudo indica, ficar sozinho. Excluímos isso do nosso cotidiano. Acho estranho. Deveria ser a base existencial das pessoas. Viver é estar sozinho. É ótimo ter a companhia dos amigos, familiares, não sou um misantropo, nada disso, mas ficar sozinho é um dos meus maiores prazeres. Ir a livrarias e sebos é um outro prazer. Ficar ali folheando os livros, vendo as capas, lendo prefácios e orelhas, essas coisas. A Rafa entrou nessa, ler e tal. Ela é uma boa leitora. E o melhor é que ela lê sozinha (ela fica muito bem sozinha). Numa livraria, na área infantil, isso é um problema. Ela fica excluída, no canto da loja. Pisco pra ela e ela pisca de volta, e ficamos assim, cada um na sua. A área infantil é dominada por pais expressivos e entusiasmados. Eu não sou nem uma coisa nem outra. Antes, pai de primeira viagem, eu achava que eu tinha de seguir o modelo, caretas e sons guturais (rolar no carpete e afins). Com o tempo você saca que a única coisa que você pode ser é você mesmo. Eu não sou assim e eu não consigo ser assim na frente da Rafa. Num questionário que ela teve de responder, sobre o pai dela, ela escreveu que eu gosto de ler e ficar quietinho.

Eu não conseguiria ser mais preciso. Ler e ficar quietinho. A tendência dos pais é fazer com que os filhos jamais estejam sozinhos. É algo terrível de se fazer. Você não permite que a pessoa exista por conta própria. E aí o cara cresce e não consegue ficar sozinho porque ele nunca pôde ficar sozinho. Ele sequer sabe que tem uma vida. E que é isso a vida, dar conta de si. Juliano Garcia Pessanha, na dedicatória do seu livro “Certeza do Agora”, escreve o seguinte: “À minha mãe, que me deu o essencial: solidão e exílio”. Eu nunca agradeci aos meus pais por fazerem o mesmo, por me darem solidão e exílio. Acho que de uma forma um tanto torta eu os agradeço dando isso pra Rafa. Ela tem solidão e exílio de sobra quando tá comigo.»

  Lucas Mayor

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