domingo, 1 de março de 2015

O Teu Riso

O Teu Riso

 Tira-me o pão, se quiseres,
 tira-me o ar, mas
 não me tires o teu riso.


 Não me tires a rosa,
 a flor de espiga que desfias,
 a água que de súbito
 jorra na tua alegria,
 a repentina onda
 de prata que em ti nasce.


 A minha luta é dura e regresso
 por vezes com os olhos
 cansados de terem visto
 a terra que não muda,
 mas quando o teu riso entra
 sobe ao céu à minha procura
 e abre-me todas
 as portas da vida.


 Meu amor, na hora
 mais obscura desfia
 o teu riso, e se de súbito
 vires que o meu sangue mancha
 as pedras da rua,
 ri, porque o teu riso será para as minhas mãos
 como uma espada fresca.


 Perto do mar no outono,
 o teu riso deve erguer
 a sua cascata de espuma,
 e na primavera, amor,
 quero o teu riso como
 a flor que eu esperava,
 a flor azul, a rosa
 da minha pátria sonora.


 Ri-te da noite,
 do dia, da lua,
 ri-te das ruas
 curvas da ilha,
 ri-te deste rapaz
 desajeitado que te ama,
 mas quando abro
 os olhos e os fecho,
 quando os meus passos se forem,
 quando os meus passos voltarem,
 nega-me o pão, o ar,
 a luz, a primavera,
 mas o teu riso nunca
 porque sem ele morreria.


 Pablo Neruda, em "Poemas de Amor de Pablo Neruda"

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